domingo, 28 de junho de 2009

O CHÁ DE QUEBRA-PEDRA



O casal estava dormindo. Ele num sono pesado, intenso e profundo. Ela nem tanto, sentia dores e só conseguia pequenos cochilos, os rins a incomodavam.
Aos poucos as dores foram aumentando, ela não suportaria, chamou o marido:
__ Meu bem, acorde estou sentindo dores.
E o marido permaneceu inerte, parecia uma pedra. Ela usa o cotovelo nas costas do marido e o chama novamente, desta vez mais alto.
__ Amado acorde, está me dando um negócio.
__ Receba! Falou ele.
__ É um negócio ruim...
__ Devolva. Aconselhou.
A mulher perde a paciência e o joga da cama para o chão.
__ Levanta imprestável, vá fazer um chá para mim que estou com dores nos rins. Falou isto já lacrimejando.
__ Chá de que? Quis saber o marido, espreguiçando-se.
__ De Quebra-Pedra, lá no quintal tem.
E lá foi o marido batendo nos móveis, tateando pelas paredes até chegar a cozinha e acender a lâmpada. Pôs água no fogão para o chá, e indo ao quintal viu várias plantas. Qual delas seriam Quebra-Pedras? Não ousou perguntar, lançou mão da primeira que alcançou e fez o chá.
A esposa tomou e com pouco tempo estava nos braços de Morfeu, dormindo. O dia amanhece ela levanta-se para os afazeres domésticos, e tão logo chega à cozinha tem um susto.
__ Marido, onde está o Quebra-Pedra que você fez chá prá mim?
__Em cima do fogão, dentro do coador.
E lá vinha ela, com um quente e dois fervendo, para cima do marido, despejando tudo que é palavras obscenas e adjetivos imprestáveis.
__Você queria me matar desgraçado, você nem sequer saber o que é Quebra-Pedra e fez chá de erva daninha para mim... Eu vou processar você por danos físicos se eu voltar a sentir alguma coisa hoje....
E o marido, com a calma de um monge. Respondeu no equilíbrio que vinha mantendo aquele casamento há mais de oito anos.
__ Veja pelo lado bom. Posso ter errado no chá, mas sua fé foi tão grande, tão intensa e verdadeira que você dormiu e não sentiu mais dores. E afinal, o que é Quebra-Pedra mesmo?
A mulher respondeu quebrando o cabo da vassoura em sua cabeça.

Moral do conto: não peça para seu esposo fazer chá de Quebra-Pedra. Use o 0800 da farmácia, é mais seguro.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

CONTEMPLAÇÃO


Contemplar uma mulher é uma arte.
A mulher não deve ser olhada de forma brusca, mas detalhadamente.
Poucos homens sabem contemplar uma mulher.
Uma vez tendo-a diante dos seus olhos, não tenha pressa, veja-a à distância, mesmo que esta seja mínima, mas contemple a mulher.
Mulher que não trai sua origem, sua feminilidade, sua vocação, seu ser é por assim dizer um santuário, um templo, um oásis, onde homens buscam e encontram seu querer. Torne-se sacerdote deste lugar sagrado, deste solo acolhedor, deste altar de amor.
Contemplar uma mulher vai muito mais além que olhar.
É preciso saber metrificar os gestos, as palavras, a voz. Elas são muitas vezes ariscas e se não soubermos nos aproximar corremos o risco de conspurcar o momento da contemplação.
Contemplar uma mulher é exercício para toda a vida e uma vida inteira. Não se aprende nos liceus, não se ensina no seio das famílias, é algo próprio, tão seu, cada homem tem sua arte, seu estilo e elas, as mulheres escolhem a quem abençoar.

06 de março de 2008

ASSIM DISSERAM ELES:


"Dinheiro faz cócega em bolso de brasileiro, enquanto não se gasta não há meios de sossegar"
Mário de Andrade

MANÉ BERADEIRO FAZ APRESENTAÇÃO HOJE


Mané Beradeiro estará hoje à noite, no Ginásio Jessé Freire, no bairro Cidade Alta, em Natal-RN, fazendo uma apresentação de causos e declamação de poesias matutas para um grupo de pessoas que se reunirão na comemoração da festa junina, de uma empresa.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

BICHO DO HOMEM



Todo menino tem uma pinta, que não ofende ninguém.
Todo boy tem uma cobra, faminta por perereca.



Todo rapaz tem um gavião, que caça masturbaçã, a mistura do prazer com a carne da ribaçã.


E todo homem, já bem feito, andando e experimentado, também cria um pelicano, grande predador, que devora sardinhas, salmões dourados, baiacus, baleias, tudo que possa ter ômega três.



E o velho, quando já tem mais de noventa, vive a angústia de relembrar o tempo áureo do Galináceo. Hoje sem cantar, sem bater asas, sem voar, sem vontade de se alimentar.

terça-feira, 23 de junho de 2009

UM BATISMO DIFERENTE

Janeiro até março foi o período da quarentena. Vivíamos o dia de forma preenchida intensamente, não nos era reservado tempo ocioso. Recebíamos instruções as mais diversas possíveis, aulas práticas e teóricas. Nossos mestres eram sargentos, aspirantes e tenentes.
A Primeira Companhia de Fuzileiros, a Altaneira, naquele batalhão, tinha como lema: “Não nos pergunte do que somos capazes. Dê-nos a missão!” Estas palavras estavam bem a nossa frente, todos os dias. Era nosso orgulho, nossa marca, nossa meta.
É interessante notar que alguns militares pareciam viver numa outra dimensão. Eles respiravam a vida militar dia e noite e noite e dia, não havia outro mundo para eles. Isto se tornava mais visível principalmente naqueles militares que haviam concluído o curso de sobrevivência na selva amazônica. Recém chegados daquela região, tinham ainda bem nítido em seu comportamento a febre e o vigor daquele treinamento.
__Selva! Era a saudação que recebíamos por parte deles. Algo que devíamos entender como bom dia, boa tarde. Mas aquela companhia nos primeiros meses do ano de mil novecentos e oitenta e cinco estava sendo comandada por um homem que pela primeira vez fez-me entender a força de uma liderança. Seu nome: Cecimar, sua patente: Tenente, o inesquecível Tenente Cecimar não era oficial de carreira, não vinha das Agulhas Negras, a grande escola militar do Brasil. Sua formação havia sido ali mesmo dentro daquele Batalhão, no Núcleo de Preparação de Oficiais da Reserva-NPOR.
Tenente Cecimar foi quem nos recepcionou no Exército Brasileiro. Aos poucos, em menos de dois meses toda a Companhia já estava literalmente hipnotizada pelo carisma e liderança que dele emanava. Nunca esqueci uma tarde de sexta feira, quando ele para por à prova sua celebridade, diante da Companhia em forma (todos os soldados enfileirados, divididos por pelotões) ele falou:
___Vou precisar de vinte voluntários para uma missão sigilosa. Quem se prontifica participar?
Nem deu tempo ele lançar um olhar sobre seus conscritos e já mais da metade daquela companhia, estava com a mão direita levantada em sinal de oferecimento. Eu fui um deles.
Mas, como tudo não passava de um teste, Tenente Cecimar agradeceu a confiança dos seus liderados. Eu aprendi que liderar é muito mais que ordenar, é, sobretudo, envolver a pessoa na sua confiança a tal ponto que ela seja capaz de por você e com você transpor obstáculos e realizar missões, de qualquer natureza.
Tenente Cecimar aprontou uma conosco durante o período que estávamos internados, sem poder sair nenhum momento do quartel. Jamais esqueceremos. Tínhamos cortado o cabelo naquela tarde, todos, era uma prática aplicada semanalmente, cabeça raspada máquina zero nas laterais. E durante o restante daquela tarde, entrando pela noite, tivemos extensivas aulas com os sargentos, aspirantes e tenentes. O banho só seria permitido no final da noite. Até lá agüentávamos os pelos mesclados com o suor em nosso corpo.
Neste período, sempre antes de deitarmos, era nos oferecido uma ceia. Naquela oportunidade o cardápio era leite achocolatado gelado. Um grande caldeirão fora trazido do Rancho até o passadiço da companhia. Já estávamos todos com canecas nas mãos, desejosos para degustar aquela bebida. Mas, eis que de repente, ouve-se a voz do Tenente Cecimar:
__Não serve ninguém agora!
Ficamos atônitos. Que fizemos? Por que aquela punição?
__Soldado Eider? Grita Ten. Cecimar.
__Pronto, Senhor!
__ Pronto uma bixiga. Diga seu número soldado!
Eider obedeceu.
__Venha até aqui soldado. É verdade que você é ateu?
__Sim senhor!
__Não acredita em Deus?
__Não senhor!
__Fique aí.
__Soldado Martins?
__ 404, Senhor!
__É verdade que você estuda para ser padre?
__Sim senhor, Tenente.
__Então vamos batizar Eider. Você vai dizendo as palavras e eu vou derramando leite sobre a cabeça dele.
Pensávamos que a coisa aconteceria sem o caldeirão. Que nada, Eider ajoelhou-se próximo do caldeirão, inclinou a cabeça e Ten. Cecimar encheu uma caneca com leite derramando três vezes sobre ele, enquanto isto eu forçosamente dizia:
__Eu te batizo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.
Finda a cerimônia litúrgica e láctea, o Tenente Cecimar ainda teve a cara de pau de dizer ao neo-catecúmeno:
__Soldado Eider você é o único que tem 100 padrinhos no mundo. E agora para festejar a alegria deste batismo, todos ( e voltou a frizar) TODOS vão tomar o leite.
Diga-se que em cada caneca vinha uma nata de cabelos de Eider.
Ao longo do ano militar, cada companhia escolhe mensalmente um soldado, aquele que melhor se destacou. O escolhido recebe um diploma de Praça Mais Distinto. Em ... eu fui o escolhido. Tiraram uma fotografia de perfil e durante um mês ela, juntamente com as fotos de outros soldados ficou exposta no Pavilhão do Comando Central daquele quartel.
Como já era poeta, muitas vezes aproveitava o tempo das vigílias, oss famosos quarto de hora, onde ficava tirando serviço militar, armado com um fuzil, para compor meus poemas. Era uma forma de passar aquele período. E foi assim, que fiz muitas poesias. Algumas permaneceram guardadas deste aquele ano. Principalmente as que traziam uma crítica ao sistema.
PRAVDA BRASILEIRA
Nada deve ficar aqui neste campo minado, além destes corpos cravados e soldados espancados.
Infante, forte que sou, destruo o ímpio a rajadas. Trituro do invasor a bélica vida acabada.
Que guerra há nesta terra pior do quê a que impera? São fortes, fracos famintos, tropas de homens ferinos.
Na massa do batalhão, são eles essência inativa, soldados que sofrem n’alma, última riqueza invicta, a verdade não falada das impotentes armas combatentes.
E se vão nesta trilha noturna, em marcha buscando o nada. Tentam dizer que treinando estão resguardando a Pátria.
E neste conformismo vão em frente mil homens sem tetos, com frio, são fetos de um projeto que a muitos já abortaram.
(26 de abril de 1985, Natal – RN, Vila Militar, sexta feira, serviço no P4.)
Por tudo isto e muito mais que ainda irei contar: SELVA!

(Esta crônica é a segunda da série Alvoradas no Itapiru)

segunda-feira, 22 de junho de 2009

ASSIM DISSERAM ELES:


"Aproximamo-nos do céu em velozes foguetes e não aproximamos nossas mãos na fraternidade humana"
Pablo Neruda

domingo, 21 de junho de 2009

NOSSOS ESCRITORES DE HOJE (KYDELMIR DANTAS)


Hoje eu começo a escrever sobre um pouco dos escritores locais. Temos grandes pérolas no Rio Grande do Norte. Kydelmir Dantas de Oliveira é um destes escritores.
Natural de Nova Floresta-PB, onde viu a luz em 1958, filho de Manoel Batista de Oliveira (Seu Né) e Angelita Dantas de Oliveira (professora). Em 1965 começou estudando no Jardim de Infância de D. Berenice, em Nova Floresta-PB. Concluiu o 2º grau no Colégio Agrícola de Jundiaí, Macaíba-RN, formando em Técnico Agropecuário. É Engenheiro Agrônomo pelo Centro de Ciências Agrárias, do Campus III, em Areias-PB.
Mora em Mossoró deste 1987. Funcionário da Petrobras.
Sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do RN.
Sócio-fundador da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço.
Colaborador de vários jornais do RN, PB e Rio de Janeiro.
OBRAS
Cangaceiro Atrapaiado
Filarmônica José Batista Dantas – 30 anos de Glória
As Vaquinhas do Doutor
Mossoró e o Cangaço
O Cangaço na Literatura de Cordel
Síntese Cronológica do Cangaço
Severino Ferreira – O Assum Preto da Viola
Dez anos – De Repente há poesia
Os três pilares da música popular nordestina
Café Filho – Um potiguar na Presidência da República
Participação na VIII Antologia Literária Internacional
Ao Mestre RAIBRITO com carinho.
Isto é o que eu sei sobre este Cabra da Peste!

MEUS FILHOS

ESTA CASA, SEM VOCÊS, PARECE ATÉ UM CUMBUCO.
FALTA GRITO, FALTA CHORO, A ARENGA, O VUCO-VUCO.
A SAUDADE É TÃO INTENSA, PENSO, ATÉ, QUE ESTOU MALUCO.
O SILÊNCIO É QUEBRADO NO TRINAR DOS PASSARINHOS, NA VOZ DE LUIZ GONZAGA, DOS VIOLEIROS NO PINHO.
E VOU A NOVA FLORESTA, NA MENTE, EM OUTROS CAMINHOS.
QUANTO É GRANDE A SAUDADE DE UM PAI POR SEUS PEQUENINOS. LONGE DO LUGAR ESTÃO A MÃE E OS DOIS MENINOS JOAQUIM ADELINO E JOÃO DANIEL, NOSSOS TESOUROS DIVINOS.

(Autor Kydelmir Dantas de Oliveira)

quarta-feira, 17 de junho de 2009

UM NOVO LIVRO VEM POR AÍ


Brevemente estarei lançando meu terceiro livro. Desta vez o estilo será crônica. Tornar-me-ei um "crônico", como já fizeram com Tasso Soares, autor de "Concerto para triângulo em Dó Maior".

Venho escrevendo crônicas há um bom tempo. CRÔNICAS SENSORIAIS será então meu primeiro livro neste gênero, e o volume I dará início a uma série biográfica, dentro da qual o leitor poderá conhecer minha vida, começando pela infância (Crônicas Sensoriais), passando em seguida pelo período que fui seminarista (Crônicas da Saudade) indo até mesmo às fileiras do Exército (Alvoradas no Itapiru).

Cada um destes livros será lançado sistematicamente. Sempre contendo nove crônicas cada. Tão logo tenha agendado o local e data de lançamento desta primeira série eu compartilharei com vocês.

terça-feira, 16 de junho de 2009

NÃO PERCAM A ESPERANÇA



Final de um dia cansativo, como os demais de segunda a sexta feira, estou no ponto de ônibus aguardando o transporte que me levará para casa.
Ali também estão outras pessoas, algumas caladas, mergulhadas em seus pensamentos. Outras com ar de preocupação, bem visível na fisionomia, e entre todas, estão dois homens conversando sobre política.
Aquela conversa era ouvida por todos, pois eles falavam alto e até quem não queria ouvia assim mesmo. Eram senhores que já haviam ultrapassado os quarenta anos vividos. Cresceram no físico, na idade, mais permaneciam crianças no pensamento.
Não deu para descobrir seus nomes. Vamos chamá-los de homem 1 e homem 2. Vejam só o diálogo daquela tarde:
H1 __ Eu não acredito em político, para mim são todos ladrões. Faz mais de dez anos que eu não voto em ninguém, não apareço nem nas urnas.
H2 __Eu também, acho que todos furtam. Eles só querem nossos votos. Eu vou até a câmara, peço ajuda para pagar uma conta de água, digo que votei neles e os engano.
H1 __ Meu título eu nem sei onde está. Não preciso dele. Nunca vou fazer concurso, não tenho esperança de ter emprego.
H2 __ Se eles fizessem alguma coisa pela gente eu até confiaria neles, mas não fazem nada. Vejam só! Estamos há mais de quarenta minutos esperando um ônibus e não vem nenhum. Isto é uma vergonha.
E o diálogo continuava com estas e outras palavras que externavam a insatisfação com a classe política, em todos os âmbitos: nacional, estadual e municipal.
As pessoas que se encontravam ali respiravam fundo. Algumas desejavam proteção auricular, outras pareciam insensíveis ao que ouviam e eu, bem, eu estava com a garganta coçando, a língua queimando, louco de vontade para entrar naquele diálogo. Foi quando um deles falou:
H1 __Para mim não tem jeito: senadores, deputados, vereadores, nada presta!
Entrei com ímpeto naquele papo.
__Permitam-me fazer uma pergunta aos senhores.
Eles olharam para mim um pouco espantados.
H2 __Pode fazer cidadão!
__Quando uma lâmpada não está funcionando perfeitamente na casa de vocês, o que fazem?
H1 __Ora que pergunta mais besta, trocamos.
__Trocam a lâmpada ou toda a fiação elétrica?
H2 __ O senhor é doido? Onde já se viu mexer na parte elétrica toda da casa por causa de uma lâmpada. Trocamos só a lâmpada.
__ E se a lâmpada que foi trocada também estiver com problemas?
H1 __ Eu volto para o lugar onde comprei, e peço outra ou meu dinheiro de volta.
__Bom! Falei isto com a mão fechada, batendo-a de encontro a palma da mão esquerda, como quem aplicasse uma martelada em leilão.
H2 __ isto mesmo. Mas o que tem haver esta troca de lâmpada com nossa conversa?
__As lâmpadas queimadas são os políticos corruptos, ladrões, insensíveis à vocação de legislador que foram outorgados pelo povo. A estrutura que chega até eles, e fornecem energia para funcionarem com perfeição ou não, é nossa, é a nossa consciência, nosso voto, nossa escolha. Votar nulo ou em branco não ajuda sua vida, sua cidade, seu país. Não cumprir o dever de cidadão eleitoral é pior ainda, pois isto não irá em nada contribuir para tirar a lâmpada queimada. Percebem que a causa não é a instalação elétrica, mas sim as lâmpadas?
Eles ficaram pensativos. O ônibus chegou, entrei e fui para casa na esperança que a vida por ser mais iluminada, depende de nós.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

CARÍCIAS



Deixa que eu te abrace e corra minhas mãos por todo o teu corpo e faça massagens com caricias que te fazem adormecer.

Deixa que eu fale aos teus ouvidos frases curtas, mas de grandes sentimentos, que eu diga bem baixinho que te amo e que te quero.

Deixa que meus beijos banhem teu ser, que meu suor umedeça tua pele e que eu te sinta bem perto de mim.

Deixa tuas roupas caírem sobre as minhas, e que os lençóis testemunhem nosso amor.

Deixa tudo, pois tudo eu deixo, mas não me deixes jamais.

Natal-RN, 21 de julho de 1998

AMOR EM CHAMAS


A maneira de namorar do bombeiro é diferente dos outros homens, ele primeiro analisa se existem os três elementos necessários e indispensáveis ao relacionamento: o comburente, o combustível e a temperatura de ignição.
Havendo este trinômio ele parte para o ataque, pois como bom soldado do fogo, ele sabe que sem estes fatores não haverá queima, combustão. E um amor sem chamas, sem brasas, não é caloroso, não é ardente, não aquece, não ilumina, não serve, não é amor.
A priori, quando um bombeiro começa um relacionamento ele deixa que a velocidade da combustão aconteça de forma natural, espontânea, permitindo que o ponto de ignição surja gradativamente.
Bombeiro também tem consciência que não abraça. Isto é coisa para civil, bombeiro faz propagação do calor, e assim agindo, ele não beija, mas faz condução, não amassa, pratica irradiação e nos finalmente, não goza, atinge a convecção.
Quando casado. Ele, o herói das chamas, sabe que para manter a união precisa conhecer as técnicas de abafamento e resfriamento, saber usar a mangueira de forma correta e o extintor certo para o incêndio certo.
Bombeiro não tem caso, o que existe na verdade é um triângulo de fogo. Crise é sinônimo de flash point (ponto fulgor).
Assim é a forma peculiar de amar do bombeiro, um homem treinado para viver combatendo o fogo, salvando vidas, dando a vida.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

THEO E O PIERCING


Theo chegou para mim e falou: __Papai estou usando um piercing! Ele achava que eu iria brigar com ele. Olhei e como não vi nenhum objeto estranho no seu rosto, pensei: "Ele teve Ter colocado este piercing no saco". Tive a coragem de perguntar: __Onde você o colocou? __Aqui papai, debaixo da língua. Agora eu me pergunto e ficaria feliz se vocês pudessem me responder: Pra que danado servirá um metal debaixo da língua? Aumenta a longevidade? Deixa a pessoa mais potente? Desenvolve e aguça a inteligência? Fará por acaso com que portas se abram mais facilmente ao sucesso? Enfim, digam-me prá que servem os piercings? Longe de mim condenar Theo. Nem ele, nem ninguém. Ele é adolescente. Está vivendo uma fase belíssima. Vive com outros dois irmãos, numa outra casa, com sua mãe. Eu sei que ele tem um trauma, e eu sou culpado, só eu e mais ninguém, por tê-lo chamado de José Theodoro de Macedo Neto. Ele não agüenta carregar este nome. Quando lhe perguntam o nome, ele responde graciosamente: Theo. __Só isto, Theo? __Não. Isto é apenas a abreviatura do trauma. O trauma completo é José .... Mas, será isto que o impulsiona a buscar e aplicar adornos corporais (body piercing)? Em tudo isto, só gostaria de dizer a este meu filho, que tenha cuidado. Tome precauções, observe se não há dor nem inflamações. Cuide da sua saúde. Eu li que todo piercing no corpo é representação de um culto pagão. Os piercings são originários da Índia há muito tempo. Há quem afirme que colocar um piercing é abrir uma oportunidade para que o mal controle sua vida. Será que isto é verdade? Não acredito. Mas aconselho a Theodoro, meu querido filho de 16 anos a ficar mais perto de Deus e deixar que em sua alma seja tatuado o selo do Espírito Santo. Está lançado o desafio. Afinal, o próprio nome Theodoro significa: dado por Deus.

MANÉ BERADEIRO FARÁ ALEGRIA DAS NAMORADAS

Sábado próximo, à noite, num restaurante de Ponta Negra, em Natal -RN, Mané Beradeiro estará declamando poesias matutas numa confraternização de casais, que se encontrarão para jantar e comemorar o Dia dos Namorados.
Aguardem postagem do evento.

A QUEDA

Na infância dele
Caíram os primeiros fios de cabelos.
Caíram os dentes-de-leite.
Na adolescência
Caíram os muros,
Caiu o tabu.
Na fase adulta
Caiu o salário
Caiu a barriga
Caiu a ficha!
Na terceira idade
Caíram as pálpebras,
Caíram os peitos,
Cresceram as orelhas.
Caiu o pinto.
Por fim caiu o corpo.
E se ele, em toda a vida só cuidou do corpo,
Caiu no inferno!

Parnamirim – RN
07 de agosto de 2007

terça-feira, 9 de junho de 2009

A LETRA MAIS NOVA DO ALFABETO


Qual é a letra mais nova do nosso alfabeto? Isto mesmo, vocês sabem qual a letra mais nova?
Minha querida professora Nevinha, a primeira que me ensinou o ABC não sabia, as outras que tive depois também nada me disseram, minha mãe silenciou, minhas irmãs idem, e até mesmo a minha esposa, minha amada esposa Sandra, que é formada em Letras pela UFRN, também nunca me disse qual era a mais nova das vinte e três letras do alfabeto.
E eu, escritor, que me fascino com as letras, fico apaixonado quanto as vejo unidas, formando palavras, versos, poemas, contos, crônicas e outras coisas mais, vim descobrir isto hoje ( 18/08/07) com meu filho Álvaro André, de apenas seis anos.
__Papai você sabe qual é a letra mais nova? Perguntou-me.
Respondi:
__Não, não sei. Você sabe?
__Sei sim, papai, a letra mais nova do alfabeto é a letra Z.
Desejei saber a lógica desta afirmação e a resposta foi segura e clara. Ei-la:
__ "A" foi a primeira letrinha a nascer, "B"a segunda..."Z" foi a última. Então ela é a mais nova. Z de zoológico!
Agora, vocês já sabem qual é a letra mais nova do alfabeto. Não esperem quarenta e três anos por esta verdade.
Viva Álvaro.

domingo, 7 de junho de 2009

O TRIO JUNINO



Estavam lá reunidos, todos os três, sentados numa nuvem Pedro, João e Antônio, três homens santos, três queridos do povo brasileiro.
Lá de cima eles olhavam a imensidão deste país continental chamado Brasil e sentiam-se orgulhosos de saber que durante o mês de junho, seriam celebrados intensamente.


O motivo da reunião era exatamente este: definir as datas para a celebração de cada um. Pedro, por ter sido apóstolo do Mestre foi logo sentenciando que desejava ser o último, João, argumentou que era primo do Messias e por isto achava-se no direito de ser o segundo na escala. Como se ver, sobrou para Antônio ser o primeiro.
Mas, quando aconteceriam estas festividades? Depois de muita conversa eles definiram três datas: treze, vinte e quatro e vinte e nove de junho. Antonio gostou da data a ele atribuída, Pedro também não fez nenhuma questão, mas, quanto a João, já não podemos afirmar o mesmo.
__Qual o problema João? Perguntou Pedro.
__A minha festa não podia ser em outra data? Quis saber João.
__Como outra data? Nós já escolhemos treze, vinte e quatro e vinte e nove. Lembrou Antônio.
__Eu sei, é que esta data de vinte e quatro não cai bem não naquele país. Falava João e apontava para o Brasil. Eu conheço aquela gente, eu sei quanto ela é sarcasta, de tudo zomba.
__ E o quem pode haver de zombaria em vinte e quatro? Quis saber Pedro.
__Viado. Vinte e quatro é número de viado no Brasil!
Antonio e Pedro riram de João Batista. Como podiam imaginar que um santo, precursor de Jesus Cristo pudesse estar preocupado com algo tão banal.
__João, não se preocupe com isto meu irmão. Treze também é dito por eles como dia de azar, mas Antônio nem sequer comentou...
__Êpa! Se treze é azar, eu também não quero esta data. Confesso que não sabia disto. Falou Antônio já com a cara trancada.
Pedro que sempre teve pavio curto, homem de temperamento forte, percebeu que estava perdendo o controle da reunião e resolveu sentenciar:
Santo Antonio falou, São João argumentou e eu (batendo no peito) São Pedro confirmei que as datas são estas que Jesus Cristo mandou.
Se São Pedro não tivesse encerrado ali aquele encontro, até hoje o povo brasileiro estaria sem saber em quais datas comemorariam estes três personagens da história cristã.

O GRANDE ATAQUE TERRORISTA






Depois do histórico ataque de Onze de Setembro, aos Estados Unidos, os terroristas mudaram de tática. Não dava mais para sair por aí derrubando aviões contra edifícios, era preciso ser criativo e ferir o inimigo de outra forma. Mas qual? Reunidos numa grande conferência internacional, que aconteceu em lugar totalmente desconhecido da mídia, por razões óbvias de segurança, eles deliberaram que iriam ferir a sociedade, tendo como alvo, um símbolo que hoje já não é propriedade americana, mas sim da sociedade capitalista e se faz presente em todos os continentes.
Desde o dia em que as Torres Gêmeas caíram que eles se dedicaram ao desenvolvimento e criação de uma máquina capaz de destruir as roupas das pessoas. Deram-lhe o nome de Adão I ao primeiro protótipo, depois veio Adão II, Adão III e finalmente Adão IV, este super potente, uma máquina que emite ondas magnéticas, num raio de quarenta quilômetros. Dentro deste espaço ele consegue deixar em fibras todos os tecidos, quer já estejam costurados ou não. Ela não mata as pessoas, sua missão é simplesmente acabar com o vestuário. Esteja ele sendo usado pelas pessoas, e ou ainda, nas vitrines e prateleiras de lojas, nos galpões das fábricas aguardando expedição, ou mesmo em grandes rolos nas indústrias de tecidos.
Adão IV é uma revolução tecnológica usada para ferir o capital, uma vez que, seu alvo é o Jeans. Isto mesmo, o velho e surrado Jeans, símbolo dos Estados Unidos que se espalhou pelos cinco continentes, atravessou fronteiras, vestiu e veste gerações. Olhe ao seu redor. Olhe......Olhe mesmo...eu espero, vou ficar até assobiando: fi fi fi fi fi fi fi ... Viu? Quantas pessoas usam jeans. Ele está presente no tênis, nas calças, bermudas, camisas, jaquetas, bolsas, etc.

Eis a razão pela qual os terroristas resolveram exterminar do planeta o jeans: Todo mundo gosta. Para testar as máquinas protótipos eles realizaram missões em território cubano. Aparentemente tudo correu bem, mas agora eles precisavam fazer esta operação numa escala maior. Vieram para o Brasil, ficaram em São Paulo, capital, e do alto do apartamento onde eles estavam podiam ver a multidão indo e vindo com o jeans.
Os terroristas foram tão bem treinados pela corporação, que entre uma foto do presidente Busch e um retângulo do jeans, eles preferiam o último. Tamanha era o ódio que eles guardavam dentro de si. Foram escolhidos a dedo. Passaram vários meses se preparando, sabiam a história dos jeans.
Este tecido tem cento e cinqüenta e sete anos de moda. Nenhum outro passou tanto tempo em evidência. Surgiu nos Estados Unidos, em mil oitocentos e cinquenta, tendo sido as primeiras roupas confeccionadas por Levi Strauss que as fez para os mineradores da Califôrnia, posto que, as roupas que eles tinham não eram tão resistentes. À priori foram primeiro usados lonas, mas logo em seguida, Levi Strauss visitou os fabricantes de lonas e pediu que o tecido fosse mais maleável, surgindo os jeans. Para amaciá-lo lavava-se com pedras, técnica que ainda é usada hoje, nas grandes lavanderias industriais.
Na década de cinqüenta os atores James Dean e Marlon do cinema americano adotaram o jeans e daí em diante ele passou a ser símbolo de uma geração que contestava tudo e todos. Espalhou-se pelo mundo tal qual rastro de pólvora e este sucesso provocou ódio entre os terroristas que hoje, através da Adão IV tentam destruir esta história.
De São Paulo eles foram em pequenos grupos para várias metrópoles brasileiras: Rio Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Fortaleza, Manaus, etc. Tudo foi metricamente planejado. E quando acionaram as máquinas, houve um caos apocalíptico em todo o Brasil.
Em São Paulo, incontáveis pessoas ficaram só de cuecas e calcinhas em plena rua. Vendo suas calças, saias, jaquetas serem desfibradas e caírem aos seus pés, sem nenhuma explicação. No Parque Ibirapuera, onde acontecia um grande show de rock também homens e mulheres tiveram suas roupas evaporadas, só que eles achavam que faziam parte da programação e acharam aquilo maravilhoso.
Em Belo Horizonte, no Parque da Pampulha, então, foi uma loucura! Cenas semelhantes a de São Paulo foram visíveis. Naquelas imediações havia um grupo de evangélicos e quando sentiram suas roupas sumindo, gritaram em uníssono: aleluia! O arrebatamento vai começar e está acontecendo pelas nossa roupas.
No Rio de Janeiro, em pleno clássico no Maracanã, templo do futebol, as torcidas estavam desprovidas de suas calças. Foi um Deus –nos –acuda. Gente nas torcidas pulava só de camisetas e comemoravam gol de forma nunca vista.
Na BR 101, em Fortaleza, vinha um grupo de motoqueiros, os Gangaceiros do Asfalto, em suas motos potentes, quando de repente, vupt! Estavam eles sem calças e jaquetas. As mocinhas que presenciavam o desfile ficaram boquiabertas diante daquela cena.
E nas indústrias, o prejuízo foi enorme. Nenhum metro quadrado do jeans estava salvo. A mesma situação nos estoques das fábricas e nas lojas. Adão IV tinha sido um sucesso, os terroristas comemoravam. Faziam as malas e agora, resolutos e obstinados seguiriam viajem para outros países. Na cabeça de cada um deles a máxima: Um mundo sem Jeans.

CONHEÇA O PROJETO MOMENTO DO LIVRO


O projeto Momento do Livro vem acontecendo desde o mês de outubro de 2008, em escolas da rede pública, tanto dos municípios, quanto do Estado. É uma oportunidade na qual os alunos podem ouvir histórias, ter palestras, conhecer melhor a produção literária que existe no Rio Grande do Norte.
Atualmente o Momento do Livro vem sendo desenvolvido na Escola Municipal Manoel Machado, em Parnamirim-RN, onde os alunos do turno vespertino estão estudando alguns contistas e cronistas aqui do Estado.
Lima Neto, Tasso Soares, Edilson Pinto, Carlos Fialho são alguns dos escritores que os alunos estão descobrindo através dos textos e biografias.
Qualquer escola pode solicitar a presença deste projeto, para tanto basta enviar um e-mail para letrasreais@hotmail.com ou então falar diretamente comigo pelo telefone 9178 0954.

SHOW ADIADO PARA JULHO

O show de Mané Beradeiro e Chica Preá que estava previsto acontecer no próximo dia 28 de junho, em Ceará Mirim, foi adiado para o final de julho. O mesmo acontecerá na última semana daquele mês, quando a cidade celebra a Semana da Cultura. Aguardem maiores detalhes aqui no blog.

sábado, 6 de junho de 2009

PASSARADA

Um Bem-ti-vi esteve aqui.
Um Sabiá passou por lá.
Um João de Barro foi trabalhar.
A Arara pôs-se a gralhar.
Um Tetéu foi infiel.
Um Pardal passou mal.
Um Sibiti pôs-se a malhar.
Um Papa-Capim canta em latim.
Um Sanhaçu fugiu pró Sul.
O Urubu foi pró velório, feliz da vida!

Parnamirim – RN, 04 de maio de 2007

Alvorada no Itapiru

Bom dia a todos,

É com alegria que estou começando a passar hoje para vocês a nova série das minhas crônicas.



Um Minuto e Nada Mais.
Por
Francisco Martins
Todos os direitos reservados a Autor®


“Esquerda, direita, esquerda, direita, um, dois, esquerda, direita. Soldado, atenção! Marcar... passo! Alto. Descansar!” Foi esta a melodia que mais ouvi no ano de mil novecentos e oitenta e cinco, a música era cantada por cabos, sargentos, tenentes e capitão, todos pertencentes à fileira do Exército Brasileiro, mais especificamente ao 16º Batalhão Itapiru de Infantaria Motorizada – 16º BIMTZ, em Natal – RN.
Estava com meus 21 anos incompletos, e como refratário atendia o cumprimento do serviço militar, posto que, na idade pedida pela lei eu estudava no Seminário de São Pedro¹. Começo então a escrever as Crônicas Alvoradas no Itapiru, que tratarão do período da caserna. Farei esta série também em nove capítulos, assim como foram as anteriores². O que escreverei sobre o tempo no “Verde Oliva” não deverá ter algo inaudito, extraordinário. Quem tem filhos no quartel ou mesmo já prestou o serviço militar sabe do que acontece por lá. Mas, mesmo assim, creio que esta crônica trará momentos de distração e quiçá saudosismo a alguns leitores.
Em Janeiro eu ingressei nas fileiras do Exército, não tinha a menor ideia do que encontraria pela frente. Minhas experiências vitais não registravam em nenhum momento a loucura da caserna. Meu pai que fora soldado, pouco falava sobre este tempo. Cheguei ao pavilhão da 1ª Companhia de Fuzileiros, conhecida como Altaneira, pesando 84 quilos e em pouco mais de um mês eu já pesava 68 quilos. Foi o regime mais brutal que eu fiz em toda minha vida. Querem saber como consegui? É simples: fome e exercícios físicos.
Rasparam minha cabeça. Disseram-me que eu iria ser chamado doravante de Soldado 404 – Martins. E que eu nunca iria esquecer este número em minha vida. Eles não mentiram. Ensinaram-nos também que ao sermos chamados pelo nome deveríamos responder pronunciando o número e quando fosse ao contrário, diríamos então o nome.
__Soldado 404?
__Martins. Senhor!
__Soldado Martins?
__404. Senhor!
No rancho as primeiras refeições foram coisas de louco. Ficávamos no sol, aguardando que desocupasse lugares para os soldados da 1ª Companhia. Estávamos famintos e cansados, mesmo assim entoávamos canções militares. Quando entramos no rancho e sentamos para degustar daquela refeição na bandeja de inox, onde tinha feijão, arroz, macarrão, carne, um copo com leite e um doce. Dito assim parece até que era um banquete, mas junte a estes alimentos respectivamente as qualidades: duro, sem sabor, sem molha, mal passada e você logo notará que apenas o leite e o doce se salvaram.
Não posso esquecer que também tinha um Oficial de Dia que sentia prazer em apitar e ordenar que as bandejas fossem passadas da esquerda para direita. Então recebíamos o que sobrou do companheiro ao lado para dar continuidade ao almoço. Eu não perdi tempo mastigando aquele feijão duro na queda. Tomava logo o leite e comia o doce e quando recebia a bandeja seguinte, fazia novamente a mesma coisa. Finda a refeição tinha tomado mais de um litro de leite e comido pelos menos uns três tabletes de doces.
Cento e oito jovens, vindos dos mais diversos cantos do Estado, com variados comportamentos até então conhecendo regras de convívio diferentes estavam ali para serem moldados, literalmente adestrados, pelas mãos de outros homens, que tinham no sangue e na alma as cores daquela farda.
Querem saber qual foi minha primeira e grande agonia? Foi quando nos deram um minuto para tomar banho. Nem um segundo a mais. Um minuto, já contado o tempo de se desfazer dos coturnos e da roupa. E para deixar a situação ainda mais agravante, toda a companhia, cento e oito homens, disputando uns quinze chuveiros, isto representava sete soldados para cada crivo. Esta operação se repetiu pelos menos umas cinco vezes na primeira semana. Sentia-me um pouco prisioneiro numa espécie de campo de concentração melhorado.
O Soldado Martins estava apenas começando a compreender e a viver um ano que marcaria sua vida e mudaria seus planos. Grandes coisas aconteceriam em mil novecentos e oitenta e cinco. Grandes e indeléveis. Afinal eu fazia parte daquele seleto grupo que assim diz a Canção do Exército: “Nós somos da Pátria a guarda, fiéis soldados por ela amados. Nas cores de nossa farda rebrilha a glória, fulge a vitória”.
Descubra comigo o brilho, a glória e a vitória que havia naquele batalhão. Bem vindos as Alvoradas do Itapiru.
Parnamirim-RN, 27 de maio de 2009
Soldado 404, descansar!


¹ As Crônicas da Saudade falam deste período.
² Crônicas Sensoriais e Crônicas da Saudade.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

9ª Lembrança


Por
Francisco Martins
Todos os direitos reservados a Autor®

“__Vamos, precisamos ir andando, senão a gente não chega a tempo de assistir a missa”. Lembro-me bem que ouvi esta frase dita por minha mãe às minhas irmãs e tia Benigna. Era um momento ímpar poder participar de uma missa que Padre Rui Miranda vinha celebrar naqueles idos de mil novecentos e setenta. Tinha eu seis anos.
Da Fazenda Santa Maria caminhávamos todos com roupas de domingo, em pleno dia da semana, para Dom Marcolino Dantas. A estrada era de barro e ao longo do percurso encontraríamos poças de lamas e somente, já próximo da casa de Zé Gado é que definitivamente lavaríamos os pés para chegar ao povoado.
Não havia capela em Dom Marcolino e as missas eram celebradas em frente ao grupo escolar, que tinha como diretora Dona Severina. Aquele dia era um encontro de alegria, onde meus pais podiam saudar seus amigos, as irmãs confabular com as colegas e nós meninos, eu e meu irmão, desfrutar de uma tarde diferente.
A missa começava com cânticos entoados por umas mulheres. O padre, como sempre, mostrava-se brabo, impaciente e sem a menor vontade de ouvir crianças conversando durante a missa. Nem chorar era permitido, que ele mandava a mãe sair do recinto com aquela criança perturbadora.
Em casa eu já havia sido advertido: “__Neto, comporte-se. Não me faça passar vergonha na frente do padre e das minhas comadres. Caso contrário quando chegarmos em casa você verá!”. Falava minha mãe e mostrava uma régua de madeira, preta, que vivia pendurada numa parede, aguardando um momento de aquecer os couros daqueles filhos que ousassem desobedecer.
Uma das coisas que me chamava atenção naquelas missas era que não tinha lamparina. O padre rezava à luz de lâmpadas a pressão. Então, o que havia de mais moderno. Finda a missa, como sempre meus pais estavam no rol dos casais que iriam ser padrinhos. Certa vez ouvi mamãe conversando com papai e dizer que já havia ultrapassado a conta de trezentos afilhados.
Mas, aquela missa, a primeira que tenho consciência que assisti, lembro que marcou minha alma. Principalmente quando em dado momento Padre Rui levantou as mãos, tendo entre os dedos uma hóstia e eu vi que todos os presentes estavam cabisbaixos, contritos, mergulhados na espiritualidade.
Eu pensei: “quando crescer serei padre!”. Tive a audácia de revelar este desejo quando cheguei em casa e foi motivo de galhofa por parte de alguns, pois minhas ações não condiziam com o espírito de quem almejava o sacerdócio. Sempre fora uma criança dada a travessuras.
Mas o tempo passou. Ventos sopraram e fizeram os coqueiros bailar em frente ao alpendre da nossa casa. Chuvas trouxeram águas que extrapolaram o leito do Rio Maxaranguape, espalhando-se por todo o vale. Inúmeras safras de cana foram talhadas e levadas à Usina São Francisco, demais eventos vieram e se foram, e, contudo, dentro de mim, no mais íntimo do meu ser, permanecia o desejo de ser padre.
Meus pais vieram para Ceará Mirim. Estudei, terminava meu primeiro grau em mil novecentos e oitenta e neste mesmo ano já me preparava através dos encontros vocacionais para ingressar no Seminário de São Pedro no ano vindouro.
Deste tempo lembro que certa vez, um domingo pela manhã, quando acolitava Padre Rui na igreja matriz de Ceará Mirim, fui por ele gritado. Nossa aquilo me doeu demais. Fiquei chateado, deixei o Padre falando sozinho com seus nervos à flor da pele e seu comportamento extravagante e muitas vezes impreciso. Fui para casa. Mamãe bem que achou algo estranho eu tão cedo num domingo, de volta para casa antes das 10 horas. Perguntou e dei uma resposta qualquer.
Fiquei vários meses sem ajudar o padre nas atividades religiosas. Mas, num dos últimos encontros vocacionais, o Reitor Padre Hudson Brandão de Araújo, deixou bem claro que um dos documentos indispensáveis era uma carta de apresentação do pároco. E agora? Que seria de mim? Com que cara eu ia me apresentar a Padre Rui e pedir uma carta para entrar no seminário?
Criei coragem, tomei pílulas de submissão e numa noite, após a tradicional missa dominical, dirijo-me à Casa Paroquial.
__Boa noite Padre Rui. Gostaria de conversar com o senhor. Pode ser?
Ele atende-me de pé. Seus óculos deixam-me ver aqueles olhos verdes que jogam cima de mim uma liderança em extinção. Põe as mãos no bolso, faz um tradicional movimento de ficar nas pontas dos pés e voltar à posição anterior e fala-me:
__Acompanhe-me.
Entramos no seu escritório. Ele senta-se atrás do bureau e diz:
__ Quer você quer conversar?
Pela pose que o padre fez eu deduzi que estava perdido. Mas mesmo assim mantive minha reverência e com muito esforço consegui dizer:
__No próximo ano eu vou entrar no Seminário e preciso de uma carta de apresentação do pároco. Sem ela não posso ser recebido naquela instituição.
Ele fitou-me e juro, que deve ter pensando: “ ah, é! Então agora você precisa de mim!”. Pegou uma pequena máquina de datilografia, alimentou-a com uma folha de papel e escreveu algo. Retirou, grampeou, pôs dentro de um envelope e me entregou.
Agradeci. Mas confesso que sai dali mais angustiado que antes. Com o envelope nas mãos e na cabeça fervilhando mil interrogações. “Que será que ele escreveu aqui? E se ele diz que eu fiquei mais de três meses sem falar com ele? E se suas palavras foram contra mim? E...”
Pensem nos momentos que duraram uma eternidade e ademais, juntem a isto que ainda pensei: “Para que você foi inventar esta história de querer ser padre!”. Dez anos havia se passado desde aquela missa em Dom Marcolino Dantas.
No silêncio da cidade adormecida, ouvindo o relógio da igreja matriz badalar vinte e três horas, eu abri o envelope, retirei o papel e com muito cuidado desfiz o grampo. Li o seu teor e nunca esqueci. Hoje vinte e nove anos depois ainda sinto o cheiro daquela tinta que deu cor às palavras por ele datilografadas que assim diziam: “Declaro para os devidos fins que se fizeram necessários que nada me consta que desabone a conduta moral de Francisco Martins Alves Neto”.
Era aquela declaração um testemunho vivo que poderia voltar a acolitar Padre Rui Miranda nas celebrações das missas, nas realizações dos batizados e casamentos. Estavam abertas as portas do Seminário de São Pedro.
E assim depois de tantos meses sem enviar a continuidade destas crônicas para vocês leitores, sendo até mesmo por alguns cobrados, entrego hoje, 23 de maio de 2009 a nona e última lembrança das Crônicas Sensoriais.


Continua..